quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Interlúdio: Sobre todas as coisas.

Ela sempre desconfiou que havia algo de errado desde o início. Não seria possível uma janela aberta para tudo o que sempre sonhou, sempre pediu e sempre cantou quando eram música seus poemas.
E a imensidão calada, o silêncio tão cortante que lhe roubavam todas as cores que se refletiam sobre aquelas águas tão turvas e salgadas, que por vezes lhe escorriam pelos olhos. Era a mesma imensidão que outrora foi o palco do espetáculo do fim da tarde, quando o Sol simplesmente se recolhe para adormecer no horizonte.

Sobre tudo quanto acreditava, muita coisa sombria lhe rodeava os sentimentos; o medo de amar demais, o medo de ir para não voltar, o medo de ser quem não é. O medo: que atravessava o palco passo a passo, desinibido, a voz que compunha a harmonia; que cravava as unhas no seu próprio coração; que lhe trazia o anseio por viagem. Que lhe construía e lhe reconstituía o amor por mil vezes, como o sol que lhe trazia mil madrugadas, ainda que parecesse se esconder no início da noite.

No início de tudo! E era assim.

Era assim que passeavam de mãos dadas, naquele momento que era só deles, como duas crianças, como duas personagens, indo e voltando pela costa, até a hora de voltar pra casa. Ela e seu Sonho...

domingo, 12 de agosto de 2012

Escritos de Viagem No 4: Ventania


Vento que vai viajante sereno
Vento envolvendo os segredos, somente
sobre essa vida de vinho e veneno
sopra esperando fazer tempestade

Sabe é verdade a verdade sentida
desce as encostas e assim num sussuro
Volta a saudade, saudade esquecida
faz as feridas sangrarem no escuro

Vento que sabe a verdade sentida
sopra esperando sangrarem no escuro
Vento envolvendo a saudade esquecida
volta a saudade e assim num sussurro

Desce as encostas de vinho e veneno
sabe, é verdade, viajante sereno
faz as feridas segredos somente
sobre essa vida, fazer tempestade.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Poema da Improvisação

Poema composto pelo gato Drake Augustus (ele é um sagrado-da-birmânia fake)

O que dizer da existência
Quando se tem nada pra fazer
Apenas um apanhado de versos
Pouca criatividade
E um senso de rima
                     [...que às vezes dá vontade de chorar

Dos Males do Ser Humano - Finale: Da Maldade


Não se sabia se era o crepúsculo ou a alvorada. O abandono de um caminho o tornava com cores fantasmas. Só havia a quietude ali, mas um tipo de quietude como se outrora tivesse existido o riso, as cores e o movimento.

Parou de olhar para frente por um tempo; era muito difícil encarar o Mundo desta maneira. Levantou-se do campo, desfez-se dos arados e das espadas, e seguiu de volta para casa

E a vida, lá fora, seguia como se nada tivesse acontecido.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Dos Males do Ser Humano VII: A Mentira

Tudo quanto fosse verdade. Tudo quanto fosse clareza. Tudo quanto fosse aquela luz que brilharia ali, mais do que todas as outras, em meio a uma multidão perdida, e perseguida pela própria sombra, esquecida, de dias atrás...

A dor que lhe causava tamanho martírio não poderia ser outra. A menina dançava sozinha por um momento, com os lábios voltados ao vento, negligenciando pensamentos e relembrando cada cenário como se fosse um flash, um filme partido que se repete no mesmo ponto.

A cena do acaso.

Deu meia volta e pôs-se novamente além das montanhas! Assim foi mais uma vez o Sol, vibrante, trazendo a imensidão da quietude. A noite. E nesta noite viajava cada vez mais como um prisioneiro de sua própria lembrança, de seu próprio acaso. E sua própria verdade.

Assim descobriu a mais dura de todas as dores, o mais escuro de todos os quartos, perdidos em sua mente tão cansada e bêbada de um sono que jamais gostaria de acordar. O sono que trouxe aquele sonho de que tudo era tão perfeito e errado, tão completo, tão belo, tão amável... E verdadeiro.

No outro dia pediu perdão a si mesmo pela mentira, e jurou jamais tornar a repeti-la.

E assim fazia todas as noites, como num ritual de auto mudança, mas que nunca mudava de fato o que lhe vinha por dentro como sendo sempre essa dor tão... Necessária.

Da Criação do Universo


E Deus disse: que haja Luz.
E tudo mais quanto era Escuro transfigurou-se!
E nada mais de vazio haveria em tudo que era Silêncio...
Do Escuro - trevas – se fez o Espírito universal,
E tudo mais surgiu como se cingido,
E nada mais poderia ter clareza.

Nada.

Nascido do silêncio,
Ou cheio dele...
Eis todo aquele incrível e adverso
Universo.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

O Ladrão e a Vendedora de Rosas

Peça de teatro composta pelo gato Drake Augustus.




Palco vazio. Penumbra. Um fio de luz marca a cena no canto direito.


Entra uma garota com um cesto cheio de rosas.

VENDEDORA DE FLORES: Oh, dia! Oh, vida! Será que é tão difícil ganhar a vida com ofício tão delicado? Por que me sobra este fardo, ter que vender flores tão frágeis durante inverno tão rigoroso?

Entra um homem, encapuzado, vestindo túnica cinza.


LADRÃO: Droga! Com mil demônios, onde foi que enterrei...
VENDEDORA DE FLORES: Com sua licença, senhor... Gostaria de comprar flores?
LADRÃO: Flores? Num inverno como este? Pra que diabos eu compraria flores... Num inverno como esse!?
VENDEDORA DE FLORES: Não sei, quem sabe para alegrar a casa... Ou dá-las para alguém...
LADRÃO: Bem, eu até poderia, mas no momento estou ocupado numa missão importante.
V.D.F. (abreviemos): De que se trata?
LADRÃO: De que importa?
V.D.F: Não seja rude. Curiosidade.
LADRÃO: Lamento informá-la de que se trata de uma missão secreta e de alto risco.
V.D.F.: Hmm... Eu bem preferia uma vida secreta e de alto risco a vender flores.
LADRÃO: Não diga bobagens. Você nem sabe do que se trata.
V.D.F.: Bem, eu poderia saber do que se trata caso você tivesse a consideração de me explicar. Na verdade, sei que sequer nos conhecemos, mas devo informá-lo que tenha uma prima que tem uma amiga que mora há umas dez quadras daqui, que uma vez contou para uma outra amiga dessa minha prima, na verdade não exatamente esta minha prima, mas uma outra que também mora há dez quadras daqui, mas para o lado norte, e não para o lado sul... Ou seria oeste? Sei que enquanto vendia estas flores...
LADRÃO: Inferno! Inferno! Você não para de falar! Estou ocupado!
V.D.F.: ... mas só para completar, enquanto esta minha amiga, que na verdade é amiga desta minha prima...
LADRÃO: Tudo bem! Já entendi. Quanto é pra me deixar em paz? Essa cesta toda?
V.D.F: Bom, a cesta toda custam-lhe apenas duas peças de prata, meu senhor.
LADRÃO: Tome esse saco de moedas. Aqui com certeza deve haver bem mais que isso. Agora vá e deixe que eu me concentre.
V.D.F.: Oh, meu bom senhor! Muito obrigada! Agora já posso voltar pra casa e certamente hoje não preciso encarar a surra que meu pai me dá todas as noites.
LADRÃO: Seu pai lhe dá uma surra todas as noites por não conseguir vender as flores?
V.D.F.: Na verdade, não. É que costumo chegar um pouco tarde sempre, sabe? Desde que não consigo controlar meu alcoolismo, fica sempre difícil voltar pra casa depois de um dia ruim de trabalho.
LADRÃO: Você é alcoólatra?
V.D.F.: Sim, na verdade, não é bem alcoolismo, é mais um vício simples por entorpecentes que adquiri quando precisei encarar o fato de minha mãe fugir para Havana com um maquinista. Se bem que não posso exatamente chamar de vício, faz uns 10 anos que uso esses entorpecentes todos os dias e nunca me viciei.
LADRÃO: Querida, vá se tratar. Você precisa se tratar. E eu preciso ir embora. Até nunca mais (sai).
V.D.F.: Mas vender flores faz parte do tratamento...

Fim.

Sem mais.